(Por Djalma Rodrigues)
Toda a imprensa nacional destacou e lamentou a morte do jornalista, escritor e roteirista maranhense José Louzeiro, ocorrida na manhã desta sexta-feira, no Rio de Janeiro, aos 85 anos. Foi um gigante da literatura, com mais de 50 obras lançada e autor do gênero romance- reportagem, que resultou em filmes como Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia, Aracelli, Meu Amor e muitos outros, dos quais acabou sendo o responsável pelo roteiro.
Onze anos atrás, tive o privilégio de entrevistar o célebre comunicador, num programa dominical que produzia e apresentava aos domingos, das 9 às 11 horas da manhã, na Rádio Capital AM. Foi nosso primeiro e último encontro, alinhavado pelo artista plástico Jesus Santos, com quem havia me encontrado no dia anterior, num restaurante.
Jesus me disse que Louzeiro estava hospedado no Grand São Luis Hotel (à época com outro nome). Telefonei, falei com ele, e acertamos a entrevista. Tive de ir buscá-lo, porque já estava de cadeira de rodas, por conta do diabetes.
Entrevista saborosa, inesquecível. Deu detalhes de como deixou São Luis, no início da década de 1950, em função das perseguições do vitorinismo. Era, na época, repórter do jornal O Imparcial. Falou sobre os perigos enfrentados no Rio de Janeiro como repórter policial de grandes veículos de comunicação, principalmente a respeito do caso Aracelli, uma menina que havia sido assassinada por filhos de gente importante do Espírito Santo.
Relatou uma emboscada que sofreu entre Rio de Janeiro e Vitória e fez a felicidade do entrevistador e dos ouvintes que ligavam a todo instante querendo saber minúcias de sua carreira. Terminada a entrevista, fomos almoçar num dos restaurantes da orla de São Luís. Eu, ele, a Elineusa e um cuidador que o acompanhava pra lá e pra cá. Não lembro o nome.
Foi exatamente neste almoço que veio à tona o entrelaçamento das relações profissionais entre ele e o não menos brilhante Bernardo Coelho de Almeida, de quem sou fã. Amigos pessoais e confrades da Academia Maranhense de Letras, José Louzeiro e Bernardo Almeida estavam juntos num projeto da TV Globo.
Meados da década de 1980 e início dos anos 1990, foram pródigos em minisséries produzidas pela TV Globo. Em 1992, aconteceu, no Rio de Janeiro, a famosa Eco Rio, reunindo autoridades do mundo inteiro, para discutir questões relacionadas à defesa do meio ambiente.
Bernardo Almeida estava lá. Oswaldo Sallas, um peruano, que era assessor do saudoso Henrique de La Roche, ex-senador e então ministro do Tribunal de Contas da União, apresentou Bernardo a uma comitiva alemã, destacando a obra prima do escritor maranhense, o romance O Bequimão, sem esquecer de relatar que Manuel Bekman, era filho de Alemão com portuguesa.
Foi o passaporte para que um dos embaixadores alemães fizesse gestão junto a Roberto Marinho, para a produção de uma minissérie sobre a saga libertária de Bequimão, que acabou sendo enforcado em 2 de novembro de 1685. (Sempre digo que ele foi mais importante do que Tiradentes). O esboço do projeto começou a ser delineado logo depois do evento e Louzeiro convidado para ser o roteirista.
Essa história me foi contada, à guisa de segredo, pelo próprio Bernardo, no final de 1992. Achei interessante e observei que esse assunto não podia ficar restrito a poucas pessoas. Deveria ser manchete. Muito importante para a história do Maranhão. Na mesma semana, encontro, no Mercado Central, outro brilhante escritor, o também saudoso, Ubiratan Teixeira, que apresentava o programa de entrevistas “54 Minutos” nas noites de sábado, não então TV Educativa, atual EBC.
-Bira, tenho uma coisa interessante pra te contar. Não vai me entregar. O Bernardo me contou isso, assim assado. Faz a abordagem, que ele te relata, já que é irmão dele de academia e parceiro de boemia.
-Deixa comigo, baixinho. Ele vai ser entrevistado lá na TV e vou escrever para O Estado do Maranhão, fica despreocupado.
Duas semanas depois, entro numa carraspana na sexta-feira à noite, e emendei pelo sábado. Neste dia, dormi a tarde de sábado inteiro e à noite, insone, fiquei em busca de informações. Por volta das 22h, sintonizo na TVE, lá estava Bernardo, daquele jeito, soberano, elegante, com aquela voz trovejante, respondendo às indagações de Ubiratan Teixeira. Discorreu sobre a minissérie, incursionou pela política, sobre os três mandatos de deputado estadual e deu uma aula a respeito de todos os assuntos abordados. Fiquei maravilhado. Achei que também tinha participação na concepção da entrevista.
O projeto da minissérie ainda estava em análise, e já se falava em escolha do elenco, quando, no dia 4 de agosto de 1994, Bernardo Almeida morre no hospital Dante Pazzanesi, em São Paulo.
Naquele ano, eu estava assessorando João Castelo numa das campanhas que perdeu para Jackson Lago para a prefeitura de São Luís. Eram 19h e estávamos, eu, o Castelo, seu companheiro de chapa como vice, Juarez Madeiros e o então vereador Manoel Oliveira, parados para abastecer no posto de gasolina que fica ali ao lado do elevado da Cohama, quando o Castelo me chama e me solta a bomba:
-Olha, Djalma, o Bernardo Almeida morreu hoje em São Paulo!
Entrei em transe, não queria acreditar. Chorei baixinho e pedi que me dispensasse da maratona de campanha naquela noite. Ele concordou. Peguei o carro e fui até o Jornal Pequeno. Antes, falei pelo telefone com a viúva, Dona Maria Augusta, e ela me deu detalhes sobre a morte do jornalista.
No Jornal Pequeno, Ribamar Bogéa pediu que fizesse o texto. Fiz e rumei para O Estado do Maranhão, cuja redação era dirigida, no período por Ribamar Correa, que também me pediu o texto. Concluído, fui bater no abrigo da João Lisboa, que naquele tempo era reduto de boêmios, de gente de bem. Enchi a cara até as 3 da madrugada. Tive a sorte, a honra e o privilégio de trabalhar com o Bernardo Almeida no extinto Jornal de Hoje, uma lenda na imprensa do Maranhão, que até hoje é relembrado por ex-funcionário e cujo último encontro foi organizado por mim.
Relatei a história entre eu o Bernardo e o Ubiratan para o José Louzeiro, que enriqueceu ainda mais a conversa sobre o Bernardo. Confirmou que seria o roteirista e destacou, que, após a morte do colega, o projeto de minissérie só não foi levado avante por falta de interesse de maranhenses que poderiam ter impulsionado e ajudado a materializar a obra.
Chorei a morte de Bernardo em 1996 e chorei agora a despedida de Zé Louzeiro, um grande jornalista, um gigante como escritor e um exímio roteirista. Na realidade, um eclético, um profissional magistral, que abre uma enorme lacuna na imprensa, na literatura e no cinema nacional.